domingo, 16 de junho de 2013

TRECHOS DE "MINHAS MEMÓRIA"

TRECHO DE “MINHAS MEMÓRIAS”
 
             No limiar do ano de 1930 meu pai deixou a fábrica Leão do Norte e estabeleceu-se com uma pequena fábrica de vinhos em sociedade com Francisco Valadares, nos fundos da pensão que dava a frente para a Praça Froes da Motta, cuja pensão era outra sociedade de Francisco Valadares com o meu avô José Moreira Duarte. Então deixamos de residir no ABC para ir residir na Boa Viagem, atual início do Largo de S. Francisco, então o começo da “estrada”. Aquela rua voltava à direita por onde é hoje a Kalilandia e seguia pela Rua do Fogo, atual Quintino Bocaiúva, e daí a continuação  da “estrada das boiadas”.
        Nos dias de segunda feira eu gostava de ir com meu pai para a pequena fábrica, à qual nos habituamos a chamá-la de “fabrico”, para ficar olhando o movimento de gado, junto com meu irmão mais velho. Também, quando voltávamos da escola, à tarde, ou aos domingos pela manhã, brincávamos sob as sombras das Gameleiras, onde se encontrava a cruz que marcava o local onde Lucas fora enforcado. Naquele cruzeiro, onde muitas pessoas acendiam velas, como ainda hoje fazem nas cruzes que marcam acidentes com vítimas fatais no interior.~
        A Igreja Católica mantinha uma caixa com uma tampa e furação de mealheiro, para arrecadar esmolas.Este local hoje está assentada a Praça dos Nordestinos. E por que o nome? Na última casa da Av. Senhor dos Passos, em frente ao antigo Cine Iris, um paraibano (ou pernambucano?) conhecido por Abel, instalou ali o Hotel Nordestino, o qual abrigava quase todos os nordestinos que na década 40 do século passado emigravam para Feira de Santana, em uma velocidade impressionante.
       Naquela época Feira de Santana foi considerada a Cidade que mais crescia no Brasil. Infelizmente os primeiros emigrantes eram pessoas de pouca cultura, em sua maioria mecânicos práticos, desempregados,  e   alguns chegaram a montar pequenas oficinas mecânicas, borracharia, sempre sob uma lona e outras até em baixo de cajueiros, especialmente após a mudança do local do campo do gado. Também vinham muitas   prostitutas, micro empresários com pequenas casas comerciais, especialmente de peças de automóvel, caminhoneiros, biscateiros, os primeiros camelôs, todos atraídos pelo movimento do tronco rodoviário que se criava em Feira com a construção da BR 116 e suas ramificações.
            Aquela migração alterou profundamente a cultura local. E como  Feira era passagem obrigatória para quem se dirigisse a Salvador e também a ligação do norte com o sul do País , a cultura local foi desviada para o comércio, ensejando assim a falência da memória do seu patrimônio cultural.
"MINHAS MEMÓRIAS

sábado, 8 de junho de 2013

TRECHO DO LIVRO "MINHAS MEMÓRIA

 
    Conheci, pessoalmente, apenas três bisavós: Capitão Moreira, Maria Rufina  e Antônia Freitas da Silva, esta  falecida no ano de 1949, enquanto Vovó Caboclinha (Maria Rufina) faleceu no início do ano de 1960   do século passado (XIX) ambas com mais de 98 anos e que muito me contaram das suas épocas.
        A minha bisavó Antônia (apelidada de (Totonha), ficou viúva aos vinte e dois anos de idade com uma filha para criar o que fez vivendo de costura. Dela ouvi muitas histórias sobre Lucas da Feira (que a sua mãe, minha trisavó, assistiu o enforcamento e lhe contou detalhadamente), enquanto que ainda pequena, lembrava da visita do Imperador a Feira de Santana, da inauguração do Teatro Santana e da Santa Casa de Misericórdia, a construção do mercado (a feira era ao ar livre). Falou-me das famílias Rubéns, Pitombo e Teles, que eram seus parentes, do movimento dos tropeiros na cidade.
         A minha bisavó Maria (apelidada de Caboclinha),  casou-se com o português Capitão Antonio Moreira Bastos (?) a quem conheceu no dia do casamento, teve também um único filho, abandonando o marido e viajando para o Rio de Janeiro,( naquela época uma mulher separada do marido era repudiada por todas famílias da cidade) em uma viagem quase cinematográfica, para quem nunca havia saído da Cidade natal. O filho, meu avô,José Moreira Duarte, deixou aos cuidados de sua mãe, com a aprovação dela. Esta morreu na década de sessenta do século XIX com quase 100 anos. O meu bisavô Capitão Moreira conheci-o muito pouco, vez que faleceu no fim da década de trinta do mesmo século passado.
        É importante mostrar a coragem daquela jovem que partiu para o Rio de Janeiro, sozinha, sem nenhum conhecido naquelas plagas, levando apenas uma pequena mala de madeira com roupas e dinheiro suficiente apenas para pagar uma passagem de trem até Cachoeira, outra de “vapor” até Salvador e a última em um navio de passageiros até o Rio de Janeiro,(que só conhecia o nome porque o seu marido, português, viveu algum tempo no Rio de Janeiro), onde ela chegou nos fins de  1883. Na  verdade,ela estava fugindo do preconceito que existia contra mulheres separadas (a palavra usada era “largada”) do marido. Procurando de casa em casa por um trabalho e sendo boa costureira e bordadeira, conseguiu emprego no mesmo dia, na Rua Frei Caneca,o que a salvou de dormir na rua. Dali, posteriormente, assistiu a abolição da escravatura em maio de 1888 e a proclamação da República em 89. Dela ouvi muitas histórias sobre a vida de Feira do seu tempo. Uma das coisas mais importantes que ela contava, era que sua avó conhecera Feira com três ruas: Da Direita, Do meio, e Da Esquerda. Segundo a sua avó, a metade das casas ainda era coberta de palha de ouricuri. Faleceu em 1963, com quase um século de vida.