quinta-feira, 18 de março de 2010

O Cemitério Piedade

No limiar do século XX, o Cemitério Piedade, sob a administração da Santa Casa de Misericórdia, era o único da cidade. Apesar de pequeno, era suficiente para abrigar o pouco número de féretros de então, e ainda se dar ao luxo de discriminar os indigentes e pagãos.
A largura da fachada era a mesma que a atual, mas a medida da frente ao fundo era de um terço, aproximadamente, do que é hoje. A parte de campas perpétuas terminava ao lado da capela, onde havia um ossuário em forma de iglu onde eram jogados os ossos de indigentes e daqueles que pagavam somente o aluguel de dois anos.
O ossuário era chamado de "vira mundo". Não sei se aquele nome foi atribuído pelo formato do globo terrestre ou se tinha referência aos pobres que estavam discriminados. Quem não era nem rico nem pobre, o que chamamos de classe média, tinham ainda a opção das carneiras (gavetas nas laterais internas). Mais abaixo da capela, vinha a parte onde eram alugadas as sepulturas por dois anos e, dividido no fundo por uma cerca, a parte exclusiva para indigência e leprosos. Ainda dentro daquele cercado, havia uma pequena parte separada para enterrar mortos que não fossem católicos, então considerados pagãos.
Não existiam velórios públicos e cada morto era velado em sua própria casa. Também não existiam carros funerários e o féretro, no esquife, era carregado por amigos e parentes de casa ao cemitério, com passagem pela igreja. Os sinos badalavam com toque especial de finados desde o momento em que o "enterro" saía de casa até a chegada à igreja. Para quem era rico, celebrava-se a missa de corpo presente na própria Igreja. Para quem não podia arcar com as despesas, a demora era pouca.
Na época em que houve a peste bubônica, nenhuma vítima da doença tinha o direito de entrar na igreja, e o sepultamento era feito na parte dos leprosos.
No local para os não católicos, enterravam-se sempre os ciganos, e vítimas de suicídio, se pobres, vez que então não se falava em prática de outra religião na cidade.
Havia em Feira um mendigo, bêbado inveterado que, certa vez, sentiu-se mal, desmaiou e foi levado para a Santa Casa de Misericórdia. Lá, um médico constatou que o paciente estava morto. Na verdade, ele tinha sofrido um ataque de catalepsia e o médico não conseguiu identificar. Era costume da época, a Santa Casa emprestar um caixão para levar os cadáveres de indigentes até a sepultura onde o corpo era depositado e o caixão devolvido. Assim, fizeram para levar o bêbado até o cemitério piedade, mas quando chegaram no caminho o defunto mexeu-se com violência e os carregadores o soltaram no caminho de forma que o caixão se espatifou pelo chão, saindo então, atônito, o mendigo.
Vendo-se sozinho, saído do caixão, aquele resmungou - "teja onde tiver, é um bom lugar porque aqui tem bodega." Assim partiu para a bodega próxima. Como o dono refugiou-se com medo do morto, ele serviu-se, à vontade, da cachaça existente. Conheci-o nos idos de 32, velho, com o apelido de "Já Morreu".

2 comentários:

Olecram disse...

Olá me chamo Marcelo gosto de ler ou ouvir histórias da minha cidade de feira de Santana você é um desbravador è prazeroso viajar nas ondas da leitura.

Olecram disse...

Gostaria de ler algo e fico curioso em saber sobre a vida do então investigador Bandeira hoje temos o complexo policial em homenagem a ele o que fez de tão grandioso ou não pra ter essa homenagem é complexo encontrar algo sobre ele.

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